Good Morning Lisbon

Last week’s column “Why America Needs Hezbollah” appeared in the Bloco de Esqeirda newsletter from Portugal under the headline “ncompetência americana.” For Portugese readers who may have missed it, here you go:

PORQUE A AMÉRICA PRECISA DO HEZBOLLAH
“Percebemos que os EUA se transformaram num país de Terceiro Mundo quando os libaneses bombardeados recebem mais do que nós”, afirma o cartoonista norte-americano Ted Rall, ao comparar os míseros dois mil dólares que o governo dos EUA deu às vítimas do furacão Katrina com o que o Hezbollah deu às vítimas dos bombardeamentos israelitas. O Hezbollah ganha em todas as comparações. Não seria de contratá-lo para reconstruir o World Trade Center?
Porque a América precisa do Hezbollah

Por Ted Rall

Horas depois de um cessar-fogo ter interrompido a guerra de cinco semanas entre Israel e as milícias apoiadas pelo Irão no Líbano, relatou o New York Times, “centenas de membros do Hezbollah espalhados por dezenas de aldeias do Sul do Líbano começaram a limpar, a organizar e a fazer um levantamento dos estragos. Homens em buldozzers dedicaram-se a abrir caminhos entre gigantescas pilhas de escombros. Estradas que estavam bloqueadas pelos destroços dos edifícios já estão utilizáveis um dia depois do início do cessar-fogo.” Quem se importa que o Hezbollah seja considerado pelo Departamento de Estado [dos EUA] uma organização terrorista? Ao contrário do nosso inútil governo, ele consegue que as coisas sejam feitas!
Os cidadãos de Nova Orleães precisam desesperadamente do espírito empreendedor terrorista. Fora da zona turística do Bairro Francês (french quarter), escreve Jed Horne no The New Republic, o que era até 2005 a cidade de maior charme dos EUA permanece “uma zona de desastre, numa área cinco vezes o tamanho de Manhattan”.
Um ano depois do que deveria ter sido um evento rotineiro, um furacão na costa do Golfo, metade da população da cidade continua refugiada – lixada por um governo que não mexeu um dedo sequer para fingir que se importa. Horne descreve “vastos espaços de uma cidade esvaziada, como se tivesse sido atingida por uma bomba de neutrões.”
Nova Orleães é uma cidade morta. Incrivelmente, os políticos não ligam nenhuma. “A maioria da água foi-se embora”, informou o jornal British Daily Mirror no aniversário da tempestade, “mas pouca coisa mudou. Circulando pelas ruas, é chocante ver quanta devastação permanece e quão pouca reconstrução foi feita.”
Os americanos viram incrédulos o seu governo responder aos desesperados apelos das doentes e esfomeadas vítimas do Katrina internando-as em campos de concentração. E depois entregou-lhes cartões de débito de 2000 dólares – uma insignificância insultuosa – para compensá-las de terem perdido tudo o que possuíam. Qualquer um pôde ver que o governo federal deixou de cumprir a sua obrigação de proteger os cidadãos. Não só se recusou a reforçar as barragens à beira do desmoronamento, como nem sequer tentou enviar ajuda depois da há muito prevista inundação. Os Estados Unidos da América, contudo, são dirigidos por homens que vêem coisas muito diferentes de, bem, todo o resto da população. Eles acham, na verdade, que as vítimas do furacão Katrina receberam demasiado.
“Dois mil dólares nas mãos de uma pessoa, isso é muito dinheiro”, explicou o director da Agência Federal de Gestão de Emergências (FEMA) David Paulison, numa declaração em 23 de Julho. Devido aos cortes orçamentais de Bush, as vítimas de futuros desastres vão ter de se contentar com meros 500 dólares.
Percebemos que os EUA se transformaram num país de Terceiro Mundo quando os libaneses bombardeados recebem mais do que nós. Lembram-se que as vítimas do furacão não conseguiam contacto com a FEMA devido à linha verde perpetuamente ocupada? Prometendo que os funcionários do Hezbollah “nas cidades e aldeias, vão contactar os que tiveram as casas destruídas para ajudá-los a reconstrui-las”, o sheik Hassan Nasrallah ordenou aos militantes do Hezbollah que percorressem os quarteirões destruídos e começassem imediatamente os trabalhos de reparação. O Hezbollah dá “mobília decente e apropriada” e um ano de renda de casa grátis a todos os libaneses que perderam os seus lares. Ao contrário dos funcionários do governo racistas que, na costa do Golfo, há um ano, resgatavam os brancos e disparavam sobre os negros, a oferta do grupo terrorista xiita também se aplica aos sunitas, aos cristãos e até aos judeus. “A reputação do Hezbollah como rede social eficiente”, observou o New York Times, “ficou comprovada em todo o lado. Jovens com walkie-talkies e pranchetas esquadrinharam os bairros xiitas do sul de Bint Jbail, tirando notas da extensão dos estragos. Os homens do Hezbollah também foram de porta em porta perguntando aos moradores que ajuda precisavam.” Com terroristas como estes, quem precisa da FEMA?
Um ano depois do Katrina, ainda se retiram corpos dos escombros. Dezenas de cadáveres continuam por identificar; o presidente, o governador e o presidente da câmara continuam a ser acusados de ineficiência. George W. Bush ainda se recusa a reconhecer as suas responsabilidades. Apenas um dia depois do cessar-fogo do Líbano, porém, o sheik Nasrallah já tinha feito um relatório completo dos estragos causados pela campanha de bombardeamentos de Israel e já desencadeara um amplo programa de reconstrução. “Até agora”, disse o líder do Hezbollah, “a contagem inicial de que dispomos de casas totalmente destruídas ultrapassa as 15 mil. Claro que não podemos esperar pelo governo e os seus veículos pesados e maquinaria, porque podem demorar um bocado.”
Como muitas vezes acontece nas emergências nos EUA, os preços da habitação, da água, da gasolina e de outros produtos essenciais subiram em flecha durante e depois do Katrina. Nasrallah, em contrapartida, advertiu os empresários para não se aproveitarem da situação. “Ninguém deve aumentar preços devido ao crescimento da procura”.
Nunca discutas com um homem que compra AK-47 às caixas.
“A força do Hezbollah”, diz Amal Saad-Ghorayeb, professor da Universidade Libanesa-Americana de Beirute e especialista da organização, em grande parte deriva do “grande vazio deixado pelo Estado”.
Parece familiar? É, para a população de Ladysmith, Wisconsin. A cidade rural, destruída por um tornado em 2002, foi abandonada pelo governo a quem a sua população pagou impostos durante toda a vida.
Talvez possamos contratar o Hezbollah para reconstruir o World Trade Center.

Ted Rall é autor do novo livro “Silk Road to Ruin: Is Central Asia the New Middle East?,” uma banda desenhada que analisa o próximo desafio externo da América. Visite-o no site www.tedrall.com

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